Para ler no domingo: Causos da Política

O Machismo dos Brasileiros

Numa cidadezinha do interior do Paraná duas famílias sempre disputavam o poder, só elas (mais ou menos como por aqui). A tradição era de que o último comício fosse feito no mesmo palanque. Tudo junto. O candidato de uma das famílias, com 70% da preferência dos votos, navegava em mar de almirante. Sorteada a fala, ele foi o primeiro. O adversário, coitado, com 21%, tinha 9% de indecisos, estava ali só para cumprir a tabela da tradição. Seu oponente, começa o discurso: "Povo da minha amada terra, povo ordeiro, trabalhador, religioso e cumpridor de suas obrigações.Boa noite". Mais que gritos e aplausos, urros se ouvem na platéia. Majoritariamente apoiadores deste candidato. Continua ele: "... se eleito, garanto a todos os amigos que irei resolver o problema de falta de água e de coleta de esgoto. Farei das nossas escolas as melhores da região, educação em tempo integral. Vou construir uma escola técnica do município, vou fazer e blábláblá...".

O candidato adversário, a cada vez que a multidão delirava com o discurso de seu oponente, via o quão difícil estava sua situação. A mulher, a seu lado, lhe dava forças e dizia: "Calma, vai passar, e logo tem eleição de novo". Feitas todas as promessas, o candidato, sem pena de seu adversário, resolveu pisar de vez na cabeça do coitado: "E tem mais, meus amigos, ordeiros, religiosos e cumpridores de seus deveres morais, eu acho que vocês não devem votar no meu adversário. Isso! Vocês não devem votar nele! Ele não respeita nossa gente, nossas famílias, nossos costumes! Ele desrespeita nossa igreja. Ele nem se dá ao respeito. Vocês não devem votar nele. Porque ele tem duas mulheres!".

A casa caiu. A mulher do coitado olhou para ele com um ódio de transpor as barreiras de chumbo de Angra 1, o mundo girou sob seus pés e a coitada foi ao chão. Os cabos eleitorais começaram a se estranhar em cima do palanque que - construído por uma empreiteira amiga do rei - já começava a rangir. Lá embaixo, a multidão se dividia entre o protesto de meia dúzia, aqueles 21%, que agora já não passava de 1 ou 2%, e o êxtase da maioria que via ali a consagração de seu candidato.

Passado o susto, vamos assim dizer, foi dada a palavra ao segundo candidato, que após se certificar de que a esposa estava melhor, se assim pode ser dito, iniciou seu discurso: "Meu amado povo, de bons costumes e moral ilibada, religioso e cumpridor de seus deveres morais, éticos e religiosos, boa noite. Quero dizer aos senhores e senhoras aqui presentes, que, se agraciado com seus votos me tornar o prefeito desta cidade, farei uma mudança de verdade. Não só resolverei o problema da falta de água, como farei também o tratamento de todo o esgoto do município, construirei uma escola técnica e mais ... construirei um novo hospital!".

Lá embaixo a multidão se dividia entre caçoar do coitado - e de sua mulher, claro - e uns parcos aplausos. Prossegue o adúltero: "Vou melhorar o salário dos professores, a merenda das crianças e ainda vou instituir o Bolsa Cidadão! Mas... prestem bem atenção, se os amigos ordeiros, religiosos e cumpridores de seus deveres éticos e morais acharem que não podem votar em mim porque tenho duas mulheres. Votem no meu adversário! Mas saibam que a mulher dele tem dois maridos!!!".

A praça veio abaixo. O palanque desandou. O pau comeu na casa de Noca. Veio o dia da eleição. O corno perdeu: 76% para o adúltero. Moral da história...

Adaptação de Cláudio Erick (facebook.com/groups/Angratransparente)